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A Diversificação da Economia de Cabo Verde

Além do "Sol e Praia": A Nova Matriz Económica de Cabo Verde


Olá. Se já visitou o Sal ou a Boa Vista, conhece o cartão de visita de Cabo Verde: dunas douradas e águas turquesa que atraem cerca de um milhão de turistas por ano. É um modelo de sucesso, sem dúvida. Mas, se está a ler isto com a mente de investidor, sabe que "monoculturas" económicas carregam riscos estruturais. A pandemia de COVID-19 expôs essa vulnerabilidade de forma brutal, provocando uma contração do PIB de 14,8% em 2020 devido à paragem do turismo,.

Vamos ser diretos: O governo cabo-verdiano aprendeu a lição. A estratégia atual, consagrada no Plano Estratégico de Desenvolvimento Sustentável (PEDS II) e na Ambição 2030, não é abandonar o turismo, mas sim diversificar a base económica,. O objetivo é transformar o arquipélago de um destino de lazer numa plataforma de serviços de alto valor acrescentado

O meu objetivo aqui é dissecar os três novos motores desta diversificação — Azul, Digital e Verde — e mostrar onde residem as oportunidades reais para o seu portfólio.

A Tríade da Diversificação


O facto central é que Cabo Verde está a executar uma transição deliberada de uma economia dependente do turismo de massas para uma economia diversificada, ancorada em três pilares estratégicos: a Economia Azul (exploração oceânica), a Economia Digital (hub tecnológico) e a Economia Verde (transição energética),.

Uma observação pessoal: Recentemente, ao visitar a ilha de São Vicente, não encontrei apenas turistas a desembarcar de cruzeiros. Encontrei engenheiros a discutir reparação naval e técnicos a instalar fibra ótica. Enquanto o turista vê o mar como cenário para uma selfie, o investidor local e o governo veem a Zona Económica Exclusiva (ZEE) de 734.000 km² — que é 99% do território do país — como um ativo industrial subaproveitado,. A mudança de mentalidade é palpável: o mar deixou de ser apenas paisagem para ser infraestrutura.

Os Novos Motores de Crescimento


  1. Economia Azul (O Gigante Adormecido):

    • Cabo Verde possui uma das maiores Zonas Económicas Exclusivas (ZEE) do mundo proporcionalmente à sua área terrestre.

    • O foco está na Zona Económica Especial Marítima de São Vicente (ZEEM-SV). As oportunidades não são apenas pescas, mas sim logística portuária, bunkering (abastecimento de navios), reparação naval (estaleiros da Cabnave) e transbordo de mercadorias,.

    • Na aquacultura, há um potencial inexplorado para a produção de camarão e atum, visando tanto a exportação como o abastecimento da cadeia hoteleira local, que atualmente importa grande parte do marisco consumido,.

  1. Economia Digital (Cyber Island):

    • A ambição é tornar o país num Hub Digital para a África Ocidental até 2030, com o setor a contribuir com 25% do PIB.

    • A infraestrutura crítica já existe: o cabo submarino EllaLink conecta o Brasil à Europa via Cabo Verde, oferecendo uma latência ultra-baixa (60ms).

    • O governo está a finalizar os Parques Tecnológicos (TechPark) na Praia e no Mindelo para alojar empresas de TIC, oferecendo um ecossistema de data centers e inovação,.

  1. Economia Verde (Energia e Água):

    • A meta é ambiciosa: atingir 50% de eletricidade a partir de fontes renováveis até 2030 e 100% até 2040,.

    • Isto abre um mercado vasto para Produtores Independentes de Energia (IPP) em eólica e solar, essenciais para reduzir o custo da energia e da dessalinização da água, que é crítica para a agricultura,.

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A Lógica da Localização


Por que é que isto faz sentido financeiro? Porque a diversificação de Cabo Verde não é uma invenção aleatória; é baseada na geografia. O país está estrategicamente posicionado no cruzamento de cabos submarinos, rotas marítimas e corredores aéreos do Atlântico Médio.

A estratégia de diversificação visa mitigar a vulnerabilidade a choques externos (como a pandemia ou a guerra na Ucrânia) que paralisam o turismo. Ao desenvolver a agricultura tecnológica (hidroponia e dessalinização) e a indústria ligeira, o país procura também reduzir a dependência de importações para consumo básico e insumos hoteleiros, retendo mais valor dentro da economia nacional,.


Informação Prática :

Para quem deseja posicionar capital nestes novos setores, o quadro de incentivos é claro e agressivo:

Investimento em Tecnologia (Digital) : O veículo principal é a Zona Económica Especial para Tecnologias (ZEET). As empresas elegíveis beneficiam de uma taxa reduzida de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRPC) de 2,5%, além de isenção de direitos aduaneiros na importação de equipamentos tecnológicos e materiais,.

Investimento na Economia Azul : O foco geográfico é São Vicente. A ZEEM-SV oferece um regime fiscal e aduaneiro especial para indústrias ligadas ao mar, incluindo estaleiros navais, processamento de pescado e energias renováveis offshore,.

Investimento em Renováveis e Agricultura : Existem incentivos fiscais específicos e garantias para projetos de energias renováveis e mobilização de água (dessalinização) para a agricultura. O governo promove ativamente parcerias público-privadas (PPP) para infraestruturas energéticas e hidroagrícolas,.

Resumo:

Cabo Verde está a mover-se ativamente para além da monocultura do turismo. O PEDS II e a Ambição 2030 traçam um caminho claro para uma economia de serviços diversificada, apoiada pela Economia Azul (logística e pescas), Digital (serviços tecnológicos e dados) e Verde (renováveis). A infraestrutura (portos, cabos de dados, parques solares) está a ser construída para suportar esta visão.

Recomendação:

Olhe para a cadeia de valor, não apenas para o ativo final. Em vez de construir mais um hotel, considere investir na infraestrutura de suporte: energia renovável para baixar a fatura dos hotéis, logística de frio para as pescas, ou serviços digitais B2B sediados no TechPark. A diversificação é onde reside o potencial de crescimento exponencial na próxima década.

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